quarta-feira, 30 de janeiro de 2013

AUTORIDADES BRASILEIRAS NÃO APRENDERAM NADA EM 52 ANOS, DIZ AUTOR DE LIVRO SOBRE O MAIOR INCÊNDIO DO BRASIL

Autor do livro “O espetáculo mais triste da Terra: o incêndio do Gran Circo Norte-Americano”, o jornalista Mauro Ventura afirmou que a tragédia na boate Kiss, em Santa Maria (RS), na madrugada deste domingo (27) –que vitimou mais de 230 jovens-, é um indício de que as autoridades brasileiras “não aprenderam nada nos últimos 52 anos”.

Na tarde do dia 17 de dezembro de 1961, mais de 500 pessoas morreram enquanto o Gran Circo Norte-Americano, situado em Niterói, na região metropolitana do Rio de Janeiro, era consumido pelas chamas. Esse foi o incêndio mais mortal na história do país.

“Basta passar a comoção inicial que os erros se repetem. O que mais impressiona é que parece que essas tragédias ocorrem em vão. (…) Naquela ocasião, foram mais de 500 vítimas. As autoridades não aprenderam nada nos últimos 52 anos. Sempre se fala em fatalidade, que é uma palavra muito cômoda para esconder os problemas”, disse.

“Conforme o tempo passa, a memória das pessoas vai se apagando, as regras vão se afrouxando e a impunidade continua”, completou o jornalista.

Embora separadas por mais de meio século, há uma série de características semelhantes entre as duas tragédias, segundo Ventura. Tanto o circo em Niterói quanto a boate de Santa Maria estavam com superlotação, e ambos não tinham saída de emergência. Além disso, há em comum o fato de que o material utilizado pelos proprietários dos estabelecimentos era altamente inflamável.

“O circo tinha apenas uma porta para entrada e saída, da mesma forma que a boate. Não havia nenhuma porta de emergência. O Gran Circo também não possuía extintores de incêndio, o material utilizado para fabricar a lona era altamente inflamável [a perícia mostrou que a lona era feita com algodão revestido por uma camada de parafina, e não de náilon, como propagava o então dono do circo, Danilo Stevanovich, morto em 2001]. No caso da boate, os extintores não funcionaram, pelas primeiras notícias que recebemos, e o teto foi rebaixado para instalação de isolamento acústico que utilizava material inflamável. Enfim, nos dois casos, não havia um sistema anti-incêndio”, argumentou ele, lembrando ainda o fato de que o circo utilizava, em 1961, grades de ferro para controle de acesso.

Fuga da elefanta


O que acabou salvando um grande número de pessoas, segundo Ventura, foi a fuga da elefanta Semba, uma das principais atrações do Gran Circo Norte-Americano. Assustada com as chamas, ela correu para fora da lona, abrindo assim um enorme buraco em uma das laterais.

“A fuga dela abriu um rombo pelo qual muita gente conseguiu sair. Algumas pessoas morreram pisoteadas, mas, no fim das contas, ela salvou mais pessoas do que matou”, disse o autor do livro.

Incêndio criminoso


A investigação policial apontou três responsáveis pelo incêndio no Gran Circo Norte-Americano, sendo o grande culpado o ex-funcionário Adilson Marcelino Alves, o “Dequinha”, posteriormente preso e condenado a 16 anos de prisão e mais seis em manicômio judiciário, como medida de segurança.

Dequinha conseguiu fugir da prisão em 1973, mas foi assassinado menos de um mês depois. Seus cúmplices foram identificados como José dos Santos, o “Pardal”, e Walter Rosa dos Santos, o “Bigode”. Ambos também foram presos e condenados, e não se sabe o que aconteceu posteriormente, segundo Ventura. “Perdeu-se o contato com os outros dois. Na verdade, quase todos os registros relativos ao circo foram perdidos”, disse.

Apesar da maioria das testemunhas entrevistas pelo jornalista defender a tese de que Dequinha fora acusado de forma injusta, o autor entende que o ex-funcionário, de fato, foi o responsável pela tragédia. De acordo com a versão policial apresentada na época, o suposto criminoso teria planejado colocar fogo no circo por ter sido demitido após dois dias de trabalho.

A demissão teria ocorrido, segundo os registros, porque Alves apresentava problemas mentais e ainda tinha antecedentes criminais por furto, o que desagradou o proprietário do circo, Danilo Stevanovich.

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